Maquina de Contos - Capitulo 5

Capitulo 4

   Sons da cidade em movimento servem como despertador para David que acorda desnorteado e suado e num emaranhado de lençol, seu corpo parece que sofreu uma carga de exercícios como nunca sofrerá antes e apesar de estar dificil de se mexer havia uma sensação boa presente, "esse não é meu quarto..." David diz tentando reconhecer o lugar, sua mente ainda esta nublada e ao tentar se desvencilhar do lençol descobre a perna de uma mulher que descansa entrelaçada em suas pernas... David permanece um tempo assimilando a imagem de uma perna feminina que não seja a de Eliana, então decide descobrir o resto do corpo da mulher adormecida.

    Lilian é quem permanece nua ao seu lado, de bruços num sono profundo. Flashs da noite passada bombardeiam a mente de David fora de ordem, mas a ordem dos fatores já não importa para o mesmo, porque a noite passada eles transaram como nunca alguém vai conseguir transar... um turbilhão de sentimentos invadem David que começa a tremer sem compreender como tudo aconteceu tão naturalmente até que... "A maquina de escrever!"... A imagem da maquina de escrever em cima da mesa da cozinha lhe vem a mente trazendo outro turbilhão de sentimentos. Neste momento esta sentindo êxtase do sexo da noite passada, remorso por trair Eliana, Feliz por saber que a maquina de escrever corresponde a todas as suas expectativas, aflito por imaginar que tudo aquilo pode, de alguma maneira, sair do controle das suas mãos e excitado só de continuar observando as costas desnudas de Lilian.
    - Não, não posso fazer isso... de novo - David diz jogando o lençol por cima de Lilian e começando a se vestir rapidamente tentando ignorar as idas e vindas que o bom senso dava em sua cabeça. Era como se o anjinho e o diabinho estivessem lutando pelas moral de David que agora seguia em direção a porta.
    - Você poderia ficar comigo só esta noite...? - David tomou um susto ao ouvir Lilian dizer isso, mas felizmente estava falando dormindo... David se permitiu permanecer mais um tempo com seus olhos repousados no rosto dela. Agachou-se arriscando acordá-la somente para dar um beijo em seu rosto.
    - Eu poderia ficar... - "Eu poderia ficar...?", David se perguntava ao lembrar de Eliana e, de que Lilian era só um personagem... Seria possível David estar se apaixonando por um de seus personagens? - Claro que não... - e assim ele saiu da casa de sua anfitriã amorosa tentando conter os pensamentos mais desleais.
    Dentro do táxi, a caminho de casa, David finge ouvir a fantástica história do taxista enquanto deposita sua mente bem longe, posso imaginar o toda a moral oscilando na mente de David, sem saber o que fazer... acabou de passar a noite com uma mulher que conheceu numa festa de negócios, foi uma noite ótima, mas foi um caso extra conjugal... ou talvez não, no fundo Lilian é somente um personagem criado por David, o caso que eles tiveram não passou de ficção... ou não, talvez David esteja preso numa corrente de infelizes coincidências... eu que sou um mero narrador já estou começando a ficar confuso, imagine para David que está no meio desse turbilhão de sentimentos.

***

    David entra em sua casa pensando em esquecer, rasgar e apagar aquela pagina para sempre da sua vida e tentar se reconciliar com sua mulher novamente, se sente um tanto arrependido de ter escrito aquilo e se dependesse dele nunca mais aconteceria de novo.
    - O que faz aqui? - David acaba demonstrando surpresa demais ao encontrar Eliana sentada na mesa da cozinha com a folha narrando detalhes da sua noite de infidelidade.
    - Uau! Eu não sei o que dizer... - David permanecia em silêncio pois ainda tentava identificar se Eliana estava disposta a conversar ou se só iria explodir e descontar toda a raiva nele. - ...Isso foi incrível, eu sabia que você iria conseguir!
    David ainda não consegue processar o que aconteceu, a boca se abre como se fosse falar algo, mas logo em seguida desiste.
    - Este é o capitulo do seu novo livro? Já tem um nome? - David focou em seu sorriso, olhou para sua mão com a folha estendida e lembrou que tudo aquilo a principio não passava somente de ficção, o único que sabia que aquilo realmente tinha acontecido era ele. Qualquer outra pessoa que lesse nem desconfiaria de que aquilo realmente aconteceu, afinal de contas David já havia exagerado e inventado muito em tudo que publicou durante todos esses anos para que Eliana pudesse acreditar que aquilo foi fruto de uma experiência real.
    - Eu... Ainda não dei um nome - Disse David pegando a folha da mão dela sem ter certeza do que dizer. Naquela folha estava narrado todo seu adultério nu e exposto para sua esposa, toda a vergonha de uma noite de luxúria impressa do jeito que sempre desejou, tanto narrada quanto física - Mas acho que vou chama-lo de fracasso.
    - Fracasso, talvez esse não seja um bom nome... - Eliana disse parecendo ainda mais viva com a ideia de que um livro estava sendo criado, que seu marido havia voltado com um livro muito promissor, havia esquecido completamente até da conversa séria que estava disposta a ter antes da possibilidade de reconciliação, ficava feliz só de saber que David voltou a escrever e voltou com algo promissor, sem saber as custas de quê aquela obra estava sendo feita. David mais do que tudo não queria acabar com aquele entusiasmo que preencheu a vida de sua esposa, fazia muito tempo que ela não ficava feliz desse jeito, mais especificamente desde a época do casamento, onde tudo estava se desenrolando naturalmente, o lote do primeiro livro esgotado, casa comprada, data de casamento marcado... havia felicidade genuína naquela época e que foi esquecida pelo dinheiro e pela soberba da vida luxuosa que tanto trabalharam pra conseguir. Aquela sensação de felicidade havia voltado para Eliana e, David agora se sentia responsável por continuar alimentando aquele sentimento, mas no fundo não se sentia bem com tudo isso.
    - Se chama fracasso, porque todos os personagens se consideram fracassados - disse mais para si mesmo do que para Eliana - Mas buscarão se redimir conforme a história se desenvolver. - prometeu novamente falando mais para si do que para sua esposa.
    Ao reler trechos do capitulo, David identificou um trecho em especifico que parecia destoar de todo o resto da trama, parecendo mais como uma mensagem do que como parte da trama.

"...Caidos com seus corpos pesados e ofegantes, o casal mais do que perfeitamente saciados de prazer e carinho caem nas graças de morfeu, o escritor falido nada precisa temer e sim se saciar de todos os desejos enquanto continuar entregando sua vida aos cuidados da Maquina de Contos."

    - Amor? - Eliana abraçou David pelas costas, arranhando de leve seu peito, totalmente alheia à cisma do escritor. - Quero que faça comigo tudo que foi narrado ai. - falou de um jeito sedutor.
    David sentiu certo incomodo de ouvir isso, tanto porque foi um lembrete de que tudo aconteceu de verdade na noite passada, mas também porque estava exausto, com uma certa ressaca da noite anterior, mesmo assim David o fez, largou o papel sobre a mesa da cozinha, ao lado da maquina de escrever que mesmo com a luz forte do dia, agora dava impressão de ser um objeto assombrado... obscuro... e beijando Eliana ignorou aquela sensação ruim, indo para o quarto deles, pretendia se dedicar a sua esposa e dar esse capitulo da noite passada como pagina virada, afinal de contas David amava Eliana com todas as forças... ou na mente dele deveria amar.

Autor: Vinícius Pacheco Silva

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